quinta-feira, 20 de dezembro de 2007

(RE)VIVÊNCIAS DO NATAL

O poeta João-Luis de Medeiros, que recentemente publicou o livro: (RE)VERSO DA PALAVRA, enviou-me este texto delicioso, da sua e nossa memória. Com os meus agradecimentos, publico o texto na integra:


Memorandum
João-Luis de Medeiros
-------------------------------------------------------------
A SAGRADA SIMPLICIDADE DA INOCÊNCIA
A memória humana é uma espécie de “diário de bordo” da nossa existência. Ao longo da vida, vamos ficando cativos da sensação de que o tempo é companheiro que veio do longe e que se deleita na planície do presente, sem sequer descalçar as sandálias do passado...
Quando há dias observava o irrequietismo da petizada, numa dessas gigantescas lojas populares onde a ilusão chinesa do preço barato faz parte do milagre pré-fabricado para o natal ocidental, senti um arrepio de saudade da famosa “noite-das-montras”, em Ponta Delgada. Para as famílias pobres, como era o nosso caso, aquela era considerada a noite das “dores de carteira”. Para as crianças do meu tempo, aquela era a noite mágica: o imparável acesso da pequenada até ao beiral das vitrinas, ilustrava o ritual da inocência atarefada na sua espontaneidade democrática. Depois, é que a realidade nos ia ensinando que afinal o “santaclôse” não era o simpático bonacheirão da igualdade distribuitiva que a imaginação sonhava. Mas isso já é estória antiga que continua a ensombrar a realidade do quotidiano...
Até meados dos anos 50 do século passado (estou a limitar a minha referência à ambiência campestre da periferia de Ponta Delgada) os nossos presépios ainda apresentavam sinais da autenticidade emocional recebida da herança franciscana: simplicidade, glorificação da pobreza material, centralidade temática na cena da sagrada familia – tudo isso envolvido pela meiga proximidade do burrito e da vaquinha, sem esquecer o exemplo de humildade iluminada praticada pelos reis-magos...
Naquele tempo, a maioria das casas rurais não disponha ainda de luz eléctrica nem de água canalizada; nem a privacidade familiar disponha de ferramentas sofisticadas de auto-defesa. A alegria popular não pedia licença para entrar nos lares, onde a pobreza era perfumada pelos galhos de eucalipto. Naquele tempo, a alegria natalícia irradiava claridades: era como uma lanterna mágica que contrariava o sombreado da pobreza rural.
Na verdade, o dinheiro não dava para adquirir superfluidades. Mas as “serrilhas” poupadas durante o ano davam para renovar parte da nossa colecção de bonecos de Vila Franca do Campo. Por outro lado, os aromas, as cores, o traçado ladeirento dos acessos ao presépio tinham de prever o efeito visual da ditadura da sombra resultante dos improvisados candeeiros de petróleo que, mesmo assim, emprestavam realce à policromia oferecida pelas velas de cera.
Ora como lá em casa eu era o mais velho dos irmãos, a partir dos dez anos fiquei responsável pela preparação dos materiais e consequente feitura do nosso presépio: colorir a serradura, e seleccionar os bonecos; arranjar musgo fresco e resistente; escolher as verduras e os pedregulhos vermelhos para montar a cena da natividade; desenhar e recortar a estrela do oriente... sempre de “olho aberto” ao nosso cachorro - “colarinho” - para não escangalhar o presépio com a súbita excitação aromática e visual do cenário...
Ah! Já me lembro: na nossa casa, não havia um claro consenso àcerca do perfil natalício da “árvore de natal”. A questão não era tanto a árvore em si, mas talvez a “despesona” exigida pela sua vocação essencialmente ornamental. Além disso, havia a discutível percepção de que a presença imperial duma árvore de natal contribuia para a marginalização do presépio...
Naquela noite grande, o meu presépio era “o melhor” do meu mundo... Tudo ali fora preparado para enaltecer a humildade da natividade centrada na sagrada família. O resto era trabalho para a imaginação: as ruelas com peregrinos, os ranchos folclóricos, as ovelhinhas indiferentes ao reboliço dos pastores que iam ao encontro da “boa-nova”, enfim, tudo aquilo parecia caminhar na mesma direcção da caravana dos reis magos...
O Menêne mija? O Menêne mija! – era o slogan mais ouvido naqueles dias. Não admira que quando chegava à hora da “missa do galo”, a maioria do pessoal já sentia os “calores” oferecidos pelos licoristas da alegria. E até o prior da freguesia, transportando o menino nas meigas palhinhas, fazia esforço para verbalizar junto dos fiéis: “beija, beija, beija... o menino.” E todos aguardavam a sua vez para tocar os lábios naquele lindo bonequinho, o nosso Menino Jesus que nascera em Belém...
Parece que ainda oiço gente a entoar melodias que fazem parte do nosso patrimonio emocional: gentes da nossa gente que há meio século, sob o relento da invernia, traziam a voz rouca mas o espírito perfumado pela alegria esperançada do natal cristão:
“alegrem-se os céus e a terra / cantemos com alegria /
já nasceu o deus-menino / filho da virgem maria...”
----------
Rancho Mirage, California
Dezembro, 2007

quarta-feira, 12 de dezembro de 2007

César dá o lugar a César

Com a devida vénia se transcreve a notícia publicada hoje no Açoriano Oriental.


"César anuncia recandidatura na Terceira em Janeiro
Regional 2007-12-12 07:00
O presidente do Partido Socialista (PS) nos Açores, Carlos César, escolheu a ilha Terceira para anunciar, no início de Janeiro, a sua recandidatura à liderança do partido e a um quarto mandato de quatro anos como Presidente do Governo Regional dos Açores.
O “AO Online” sabe que Carlos César já teve reuniões nos Açores para preparar o anúncio da
sua recandidatura e terá sobre esse assunto uma reunião “decisiva” em Lisboa com o líder do PS nacional e Primeiro-Ministro, José Sócrates, ainda antes do Natal. César deixa assim para os últimos dias antes da data limite de 15 de Janeiro (a da apresentação de candidaturas às primeiras directas do PS nos Açores) a quebra do “tabu” da sua recandidatura, embora no seio do Partido Socialista açoriano ela fosse considerada um dado adquirido. Por várias vezes durante os últimos meses, Carlos César avançou em actos públicos com promessas de governação para os próximos quatro anos e chegou mesmo a anunciar, à saída do último secretariado regional do PS, em Ponta Delgada, uma “intensa” remodelação no Governo Regional, com a entrada de muitas caras novas, caso voltasse a ganhar as eleições. No entanto, César recusou sempre em todas as ocasiões assumir-se frontalmente como recandidato a um quarto mandato como presidente do Governo, gerindo a expectativa do anúncio da sua recandidatura até saber em concreto quais seriam os seus opositores nas eleições regionais de 2008, nomeadamente o recentemente reconfirmando líder do PSD-Açores, Costa Neves, de quem César chegou a ironizar - aquando da queixa sobre apelo ao voto no “sim” ao aborto através do site do Governo - ao dizer que nem com ele na prisão, Costa Neves conseguiria vencê-lo. Para se recanditar a um quarto mandato como Presidente do Governo Regional dos Açores, Carlos César aproveita uma excepção prevista na revisão do Estatuto Político-Administrativo dos Açores, que fixa em três o limite de mandatos do Presidente do Governo, embora permita um quarto mandato a quem já cumpra, na altura da sua revisão, um terceiro mandato. Recorde-se que o PS realiza as suas primeiras eleições directas nos Açores no dia 15 de Fevereiro, estando o seu XIII Congresso marcado para 18, 19 e 20 de Abril, na ilha de São Miguel. A recandidatar-se, Carlos César não deverá ter oposição interna nas directas de 15 de Fevereiro.fdgf
Rui Cabral" www.acorianooriental.pt

segunda-feira, 10 de dezembro de 2007

30 medidas para memória futura


O Presidente do Governo na Assembleia Regional anunciou as seguintes medidas:
"No âmbito da consolidação dos poderes autonómicos, e na sequência de negociações bem sucedidas com o Governo da República, a região vai assumir o Serviço de Cadastro do Instituto Geográfico Português e vai passar a poder estabelecer as regras de concessão dos apoios, recolher as candidaturas, proceder à sua análise formal e de mérito, aprovar e contratar projectos, fazer a validação das despesas e fazer os pagamentos das ajudas comunitárias canalizadas pelo IFAP, tornando-os mais céleres.Ainda no sector agrícola, será criado um novo quadro de incentivos financeiros aos produtores que queiram apresentar projectos de redimensionamento ou emparcelamento das suas explorações; será dada prioridade ao alargamento dos perímetros de ordenamento; avançará a instalação do projecto Rede Meteorológica Automática; e será implementado o apoio em 90% do custo de transporte de uma lista de produtos de origem regional das chamadas “ilhas da coesão” para as outras ilhas e o apoio em 75% no custo do transporte de flores, plantas ornamentais e de alguns frutos para o exterior.No transporte aéreo de passageiros serão criadas tarifas vocacionadas para emigrantes dos Estados Unidos da América e do Canadá, que também incluirão, para os passageiros originários desses destinos, um desconto de 50% no excesso de bagagem nas ligações internas regionais; e arrancará em 2008 o Programa de Turismo Sénior, em colaboração com o INATEL, financiando mil pacotes turísticos, a apenas 25 euros, de uma semana durante todo o ano, o que proporcionará aos idosos oportunidades de turismo interno de qualidade e de segurança e uma animação especial do mercado hoteleiro nas ilhas mais pequenas.Nos sectores sociais, destaque para a Rede Regional de Cuidados Continuados, que se assumirá como um conjunto integrado de iniciativas de cuidados de saúde e de apoio social; para a adaptação de um programa espanhol – o Programa TU DECIDES – de prevenção do consumo de drogas; e para a formação de um Centro de Apoio às Famílias na área das toxicodependências.Ainda tendo em especial atenção a juventude, está determinado o aumento de duração do Programa Estagiar para licenciados – nas ilhas de Santa Maria, Graciosa, São Jorge, Faial, Pico, Flores e Corvo – dos actuais seis meses para dois anos e o acesso a esse programa por um número de jovens até ao triplo do actual.Na área da saúde, e na sequência do programa de eliminação das listas espera no Hospital de Ponta Delgada, o Governo irá celebrar uma convenção com o Hospital da Horta, para resolver, até ao fim do primeiro semestre de 2008, a totalidade da lista de espera em imagiologia, permitindo efectuar 300 TAC’s, 800 ecografias e 800 mamografias.Outras medidas anunciadas relacionam-se, por exemplo, com o salário mínimo regional, que Carlos César pretende fixar em 500 euros, pelo menos em Janeiro de 2010; com reduções das taxas de IRS com impacto nos escalões de rendimentos mais baixos; com a concessão de apoios complementares aos jovens açorianos que frequentem o ensino superior e cursos profissionais pós-secundários; com a diversificação do capital da SATA e de outras empresas do sector público; com a criação de uma sociedade gestora de participações sociais; e com a instalação do “sistema de alerta de cheias”.(Gacs)

quarta-feira, 5 de dezembro de 2007

A postura dos líderes políticos

O PSD acaba de realizar mais um congresso, uma vez mais sob a liderança reforçada de Costa Neves. O lider social-democrata, que nas primárias não conseguiu desfeitear Natalino Viveiros na Ilha de São Miguel, apresentou uma lista única para os orgãos regionais do partido que obteve a larga maioria dos congressistas.
Para além dos apelos aos militantes de que agora é que vai ser, porque o governo está esgotado e temos um projecto diferente para o desenvolvimento dos Açores, nada mais passou para a opinião pública digno de realce.
Mesmo assim, o PSD que há mais de uma década se encontra fora da cadeira do poder, vai tocar a reunir para conquistar as cadeiras do poder, perdidas após a saída de Mota Amaral. Está, portanto a criar um novo elan que se traduz num discurso populista e por vezes extremista do seu lider terceirense. Resta saber se com este impetuoso toque a rebate, as hostes tradicionalmente social-democratas se vão congregar em torno de um lider, que não conseguiu fazer-se ouvir nem no Parlamento Nacional, nem na Câmara Municipal de Angra. Por isso, de tempos a tempos, ei-lo na comunicação social para criticar, com veemência, o óbvio mas sem apresentar alternativas mobilizadoras e inovadoras.
C.César já em campanha para as próximas regionais, tem vantagem pela obra feita. Começa, no entanto, a indiciar falta de frescura e de novas ideias para o desenvolvimento das Ilhas, a par de um distanciamento das pessoas e dos militantes do seu partido.
Governar bem e responder às necessidades das populações deve gerar empatia, o envolvimento e participação dos cidadãos no processo de desenvolvimento. De contrário, o alheamento popular atinge os próprios fundamentos de uma democracia participada e dinâmica.
Quase em fim de legislatura, este deve ser um motivo de reflexão atenta tanto para C.Neves como para C.César.