sábado, 12 de março de 2011

Romarias de fé e saudade

ROMEIROS

Céu de chumbo! Escuta... Ave
Maria, cheia de graça...
No seu cantar arrastado
A romaria lá passa...

Acordam ecos da serra,
Ó quanta fé nessa voz!
Numa toada dolente:
Mãe de Deus, rogai por nós!


Ao escutá-la, comove-se
O coração. Que tristeza!
Anda naquelas palavras
Toda a dor da Natureza.

Dor deste céu que sufoca,
Pelos atalhos de lava
Cascalho cortando os pés,
Picanços de silva brava.

Dor desta terra em silêncio,
Quando se põe a tremer...
Falas ocultas da terra
O que estarão a dizer?

Dor de quantos cantando
Choram na voz comovida,
Nas desgraças que sofreram
Os prantos da sua vida.

E o rancho passa. Os romeiros
Dois a dois eles lá vêm...
Na procissão da tristeza
Por esses campos além.

Vêm descalços. Na cabeça
Um lenço grande, enramado,
A saca e as botas ao ombro
E o chaile posto a um lado.

Numa das mãos um bordão
E o terço para rezar,
Ao sol ardente ou à chuva
Não param de caminhar.

E esta Ilha é tão comprida...
Sete dias de jornada!
Não há capela da Virgem
Que não seja visitada.

Senhor Mestre de Romeiros,
Tão velhinho inda ali vai,
Beijam-lhe os outros a mão
Como filhos a seu pai.

Ó procurador das almas,
Reza por minha intenção.
Quantos sois? Eu rezarei
Por quantos no rancho vão.

E junto à voz dos romeiros
Acordam ecos da serra...
Irmãos! Uma Ave-Maria
Pela paz da nossa terra.

Armando Côrtes-Rodrigues
(1891-1971) escritor, poeta, professor.

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